“Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, mas como sábios, remindo o tempo; porquanto os dias são maus.Por isso não sejais insensatos, mas entendei qual seja a vontade do Senhor.”Ef 5:15-17
Meditando há alguns
meses no verso 16 desta passagem da carta aos Efésios,
tenho olhado para o tempo com outros olhos. “Remir o tempo” é tão comumente
falado no nosso evangeliquês, que é quase um clichê, e muitas vezes usada,
inclusive por mim, com o sentido de ser rápido, apressar-se, ser prático. Mas,
creio eu, que há um significado mais amplo, com aplicação igualmente prática, a
ser extraído deste ensino apostólico.
O tempo é algo
precioso. É algo valorizado em toda a Bíblia. É tão valorizado que, para
descrever a criação, em Gênesis 1, foram usados dias, que nada mais são que uma
expressão de tempo. A ordem de separar um dia em sete para dedicá-lo
especialmente ao Senhor, presente na Lei, também. O salmista pede que o Senhor
nos ensine a contar nossos dias para que alcancemos sabedoria (Ensina-nos a
contar os nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios. Sl
90:12), e é
nítida a correlação entre o clamor de Moisés e o ensino de Paulo. Ambos relacionam
a sabedoria com o uso do tempo, e usar o tempo, ou melhor, redimi-lo, é algo
que preciso estar disposto a aprender.
Porque
o tempo é importante? Ora, eu poderia listar várias razões, umas mais, outras menos
óbvias, mas vou me deter em três:
1.
O tempo é incerto: simplesmente, eu
não sei quanto tempo ainda tenho. Posso dizer, baseado em dados estatísticos
que, aos 43 anos, tenho menos do que já gastei, mas não posso afirmar quantas
horas, dias, ou anos ainda terei. Neste instante, sequer posso afirmar que
terei tempo para concluir este texto;
2.
O tempo, apesar de incerto, é curto, é
limitado: esta característica determina o seu valor. Não vou ter tempo para
sempre, não posso dispor dele como se sempre fosse tê-lo. Na verdade, o dia de
hoje, nunca mais o terei novamente;
3.
O tempo, uma vez mal utilizado, é
irrecuperável: não tenho como voltar no tempo para corrigir o mau uso dele. O
que fica no passado serve de lição, mas não é possível recuperar este tempo
para fazer as coisas diferentes.
Por se tratar de um
recurso incerto, limitado e irrecuperável é que o tempo precisa ser remido (ou
redimido, são sinônimos), na vida de um homem regenerado. Um cristão não pode
usar o tempo da mesma forma que o ímpio. Outras devem ser as prioridades,
outras devem ser as urgências, outra deve ser a finalidade. O texto de Paulo
traz dois ensinamentos que considero bem práticos neste exercício redentivo.
O primeiro ponto que
quero ressaltar, é uma declaração taxativa: os dias são maus. Vejamos que o
apóstolo não diz que há dias bons e dias maus, nem que os dias podem ser maus.
Ele afirma: os dias são maus. E o que isso quer dizer? Quer dizer que não há
nada no meu dia que naturalmente favoreça o viver cristão. Não há nada em nosso
tempo (tempo no sentido de cultura, era, época) que não necessite ser redimido.
Não dá, por exemplo, para esperar que o desenrolar do dia favoreça a piedade, a
longanimidade, a caridade, o perdão, a proclamação do Evangelho. Isso não
acontece, vocês sabem. Nossa cruz, que tomamos dia a dia, é expor o nosso
cristianismo na vida prática, diante de uma multidão que, se vê Jesus em nós,
gritará: Crucifica-o! Os dias são maus, e remir o tempo significa andar na
contramão destes dias, vivendo a fé que confessamos, sabendo que estamos desde
já, para este mundo, crucificados.
O segundo ponto é que
nos é exigida prudência no andar, sabedoria. Andar com prudência, envolve
cuidado, mas não o cuidado derivado do medo, da incerteza. Antes, trata-se aqui
do cuidado que nasce de, sabendo como devemos andar, o que devemos fazer, zelar
para cumprir o que foi ordenado. Andar prudentemente está intimamente
relacionado com a declaração de que os dias são maus. Ou, quem anda de forma
descuidada em meio a um terreno hostil? Só um insensato faz isso. Mas, não
somos chamados à insensatez, mas à sabedoria, logo devemos estar sempre cônscios
dos dias maus em que vivemos, da necessidade de que o tempo seja remido e,
sabedores da forma correta andar, vigiarmos, sermos prudentes ao obedecer os
ensinos recebidos. Andar prudentemente significa entender a vontade de Deus,
buscar nas Escrituras o que já foi revelado sobre Deus, sobre Seus desígnios,
significa andar com os olhos postos em Cristo. Redimimos o tempo, enfim, usando
o tempo para a glória de Deus, buscando em cada instante do dia, andar conforme
o que aprendemos de Cristo. Um cristão é convocado a glorificar a Deus no seu
trabalho, no trânsito, no lazer, na vida familiar, no convívio social, na fila
do banco e, claro, nos momentos reservados para o culto, seja doméstico, seja
público. Assim remimos o tempo.
Concluindo, vivemos
em dias maus, dias que, em seus cursos normais, são cheios de impiedade,
violência, mentira, hipocrisia, egoísmo. A sociedade é formada, em grande
parte, por homens que não conhecem a Deus, e o sistema como um todo reflete a
depravação de cada homem. Nós, todavia, se nascemos de novo, temos uma
prioridade: glorificar a Deus. Ao morrermos, o legado que deixamos para as
pessoas com as quais convivemos precisa ser o quanto de Cristo testemunhamos,
muito mais que nossa reputação profissional, por exemplo. Remir o tempo é algo prático, é exercitar
diariamente o que as Escrituras nos ensinam, é fazer da nossa profissão de fé a
nossa identidade, a marca que deixamos, os rastros que outros podem seguir. E,
finalizando, descrevo algumas práticas que tenho adotado, nas quais preciso
ainda melhorar muito, mas que têm me sido muito úteis:
- Ter um tempo
específico, diário, e definido de leitura bíblica
- Tirar, a cada duas
horas, no mínimo 5 minutos para oração (pretendo diminuir os intervalos e
aumentar o tempo de oração, mas este já é um começo)
- Passar mais tempo
estudando as Escrituras e temas de teologia do que assistindo TV
- Ler mais teologia
que ficção (sem deixar de ler ambos, afinal a arte é graça comum, e toda beleza
vem de Deus)
- Ver cada
encontro pessoal no dia como uma oportunidade de expor o Evangelho, e
aproveitar o máximo deles
- Antes de dar cada
passo no dia, entender como ele glorifica a Deus
- Ser o mais
produtivo possível no trabalho, para que as preocupações com ele não consumam
tempo adicional
- Olhar cada momento
de lazer como uma forma de testemunhar de Cristo
Bom, eu poderia
listar mais uma porção de coisas, mas estas são as que tenho disposto a mim e a
minha casa a fazer.
E, como vocês
perceberam, consegui terminar o texto, pela misericórdia do Senhor!
Que o Senhor nos
conceda a graça necessária!!