29 de novembro de 2012

De madrugada


Tu és toda formosa, meu amor, e em ti não há mancha.(...) Jardim fechado és tu, minha irmã, esposa minha, manancial fechado, fonte selada. Ct 4:7,12

Acordei nesta madrugada, num daqueles momentos em que o sono é interrompido sem qualquer motivo evidente, e olhei para o lado, vi minha esposa dormindo tranquila, olhei todo o nosso quarto, e por alguns instantes, até que o sono voltasse, fiquei imerso em um sentimento de gratidão quase indescritível. Este é o meu assunto de hoje, gratidão, e vou abordá-la de forma bem específica, pessoal, como fui tomado por ela hoje!
            É interessante a forma como eu entendia o que era ser grato, antes de conhecer o Senhor Jesus... eu nunca fui o que se poderia chamar, entre os ímpios, alguém ingrato. Sempre agradeci quando recebia algo, ou alguém me prestava um serviço. Sempre pedi cortesmente, quando eu demandava algo de qualquer pessoa, sobremaneira das mais próximas. Mas isso é tão diferente do que é ser grato... sem conhecermos Jesus, a Sua vida e a Sua obra, não sabemos sequer o que é um “favor”. Sendo sincero, eu caminhei mesmo alguns anos no Evangelho sem entender o significado da graça, logo não sabia o que era ser grato, logo caminhava feito bêbado, quando tenta se manter reto apesar do efeito do álcool que o faz cambalear.

            Hoje, pela graça de Deus, meus olhos são limpos a cada dia, e vejo melhor quem eu sou, quem Deus é, e como esta graça é que opera todas as coisas, com o objetivo de me conformar a Jesus, de fazer-me semelhante a Ele. Só essa percepção seria suficiente para sustentar a minha gratidão por toda a eternidade. A gratidão é fruto da revelação clara de um Deus perfeito, soberano, imutável, justo, amoroso e bom, que elege homens vis, pecadores, iníquos, perversos, contaminados, seduzidos por tudo o que O ofende, para fazê-los santos, separados para Ele, para resplandecerem a Sua luz e anunciarem o Seu Filho, que uma vez morreu por estes homens, para que eles fossem regenerados e justificados diante do Pai. Sei que esta definição pode carecer de profundidade teológica, mas reflete exatamente a forma como me sinto, quando contemplo a beleza do meu Senhor. E eu sou grato por ser conduzido por Ele a amá-Lo, por ser trazido e tratado por Ele sempre que erro (e erro muito...), por ser Dele.

            Mas, como disse no início, hoje fui tomado por esta gratidão imensa, de uma forma particular, específica. E testemunho hoje a minha gratidão ao Senhor por ter recebido Dele uma esposa. E que esposa!!! Sou um entusiasta do meu casamento. Amo estar casado, porque amo o Senhor que criou o casamento, e amo também a esposa que Ele me deu. Olhava, na madrugada, para o lado, e pensava: “que fiz eu para merecer um só segundo com esta mulher?” “Que fiz eu para merecer que ela aceite cada imperfeição do meu caráter, cada dificuldade já conhecida, e cada uma que ainda vai surgir?” ”Que fiz eu para merecer uma mulher que se adapte às minhas manias, e as tome por agradáveis a si?” “Que fiz eu para merecer uma mulher que abra mão de planos, desejos e ambições, investindo no nosso relacionamento?” “Que fiz eu para merecer ouvir dela que me admira, e ver esta admiração revelada em cada gesto ou atitude?”  E ouvi, claramente, o Senhor me responder: você nunca precisou fazer nada... Eu escolhi esta mulher para Mim, e então a dei a você! Ela é minha, fonte selada. Tudo o que você precisa fazer é olhar para Mim, é receber de Mim a força e a sabedoria necessária para ser para ela o que Eu determinei que você seja. Não é você para ela, ou ela para você. São ambos para Mim. Seu casamento é Meu, filho! Seja grato! Seja grato! Você nunca mereceu, nem vai merecer uma filha Minha!

            Chorei quieto diante destas palavras! Chorei de contentamento. Feliz por saber que é Ele e não eu, que sustenta o casamento. Feliz por não precisar confiar em mim, ou nela (nós não somos dignos de confiança, vocês sabem...), mas que eu devo confiar Nele.
            Animo você, leitor, a olhar para Jesus a cada instante do seu casamento. A olhar para Jesus todas as vezes que olhar para seu cônjuge.  Você vai ter outra visão do seu matrimônio. Se você é solteiro, olhe para a perspectiva do casamento dentro do propósito de Deus. Tem que ser para glorificar a Ele. A cada dia, marido e esposa são conformados a Cristo, e Deus usa toda situação cotidiana, toda mesmo, para promover este aperfeiçoamento.

            Animo você, marido, a olhar para a sua esposa como uma filha de Deus. Antes dela ser sua, é Dele! Antes de ter sido criada para lhe auxiliar, foi criada para glorificar a Ele. Trate a sua esposa de forma que Ele fique satisfeito! E Ele vai gerar em você o amor que será o fio condutor da sua vida, expressando a vida Dele. Tenho feito este exercício, e sei bem o quanto a minha esposa é preciosa para Deus, e que preciso de uma medida de graça que me possibilite tê-la como igualmente preciosa para mim. Esta graça, concedida por Deus, muito além da minha (in)capacidade, faz com que eu ame a minha esposa a cada dia mais, faz de mim um homem convicto da indissolubilidade deste laço, faz meu corpo desejá-la, faz de mim seu protetor, seu provedor, responsável por ordenar a minha casa segundo a vontade de Deus.

            Antes de concluir eu não poderia deixar de fazer um breve comentário a respeito dela, daquela que é manifestação do amor e da graça do Pai na minha vida, daquela que foi preparada para mim desde antes da fundação do mundo, minha esposa, companheira, auxiliadora idônea. Deus, em sua soberana bondade e misericórdia, não olhando para toda a sorte de iniquidades em que eu vivia perdido, me deu uma esposa que ama a Ele mais que a mim (e me ama muito...), que serve a Ele antes de me servir, que busca a Ele todos os dias, cuja submissão e proceder me conduzem à oração, à meditação na Palavra, e tornam leve o exercício do meu sacerdócio. Eu tenho em minha esposa esteio, adorno, beleza, santidade. Eu tenho uma mulher que preenche todos os anseios do meu coração, que me satisfaz, sacia os meus apetites. Com ela eu oro, adoro, compartilhamos juntos a Palavra. Com ela eu dou risadas, conto piadas, vejo memes na internet, tiro fotos, brinco com as nossas cachorrinhas. Com ela eu lavo louça (apesar de sujar muito mais...), com ela eu traço rotas, tenho ideias, vejo filmes, como pipoca, faço dieta, ando na praia. Com ela eu dou graças ao Pai. Com ela eu caminho para Ele.

            Sou grato ao Senhor porque o casamento que Ele me deu me torna mais Dele! Sou grato por madrugadas como esta, onde lágrimas e sorrisos se harmonizam.

            E seremos uma só carne!!! E já somos!!! E seremos assim, até que Ele venha!!!
            E Ele vem!!!!

21 de novembro de 2012

Do arrependimento II


"Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a tudo quanto tem não pode ser meu discípulo." Lc 14.33.


            O arrependimento, fruto da bondade de Deus (Rm 2:4), é condição essencial à conversão, à entrada no Reino de Deus. Só um homem arrependido, contrito, é regenerado. Não há regeneração sem arrependimento!
            O arrependimento bíblico é uma mudança de atitude interior, uma mudança de governo. Quem antes era escravo do pecado, agora é servo de Deus! E como isso é operado, em termos práticos, na vida diária, pelo Espírito Santo?
            Jesus nunca pregou o Evangelho, buscando facilitar a sua aceitação, buscando torná-lo agradável. Jesus, ao contrário, sempre enfatizou as demandas e exigências da vida cristã. Vemos nos evangelhos isso com muita clareza:

“E quem não toma a sua cruz, e não segue após mim, não é digno de mim. Quem achar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a sua vida, por amor de mim, achá-la-á”  Mt 10:38-39

“Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me; Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de mim, achá-la-á.” Mt 16:24-25

“E chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me. Porque qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas, qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará.” Mc 8:34-35

“E Jesus, olhando para ele, o amou e lhe disse: Falta-te uma coisa: vai, vende tudo quanto tens, e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, toma a cruz, e segue-me.” Mc 10:21

“E dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me. Porque, qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas qualquer que, por amor de mim, perder a sua vida, a salvará.” Lc 9:23-24

“Quem ama a sua vida perdê-la-á, e quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna.” Jo 12:25

            Como a igreja perdeu esta pungência, em sua pregação...  hoje são enfatizadas a prosperidade material, a relevância cultural do cristão no mundo, a adequação do crente à sociedade, a conformação aos valores e hábitos dos ímpios, tudo isto disfarçado de “contextualização missional”. Jesus foi o obreiro exemplar e nunca usou estes estratagemas. Ele cria no poder de Deus expresso em Seu evangelho, como suficiente para gerar arrependimento e fé, para a salvação dos Seus eleitos! E não há porque hoje enfatizarmos algo diferente do que fez o nosso Senhor! E a ênfase é no arrependimento e na fé, para que haja a salvação. A ênfase é na soberania e suficiência de Cristo neste processo. É Ele quem nos conduz ao arrependimento, é Ele que nos dá a fé, e é Ele quem nos salva, sem mérito nosso, unicamente por Sua graça.
            Voltando ao início do texto, onde falávamos da operação prática do arrependimento, vemos que Jesus coloca quatro situações necessárias para esse operar divino:

1.      Negar a si mesmo – reconhecer Cristo como Senhor, significa negar qualquer ação minha como capaz de prover tanto minha salvação, quanto meu caminhar até o Alvo. Negar a mim mesmo, significa na prática, colocar a vontade da minha carne sujeita à vontade de Deus. Significa praticar o verso da oração de Mateus 6, onde digo que “seja feita a Tua vontade, na terra (a começar em mim), como no céu”. Significa meditar incessantemente na Palavra, orar sem cessar, ler a Bíblia, procurando aplicar cada ponto à minha vida, conhecer o meu Senhor, para que haja discernimento da Sua vontade. Significa nunca confiar em meu coração.
2.      Tomar a cruz – para que seja efetivo esse negar-me, preciso ter consciência de que a cruz faz parte da caminhada, desde a conversão até o meu encontro com o Senhor. Tomar a cruz é seguir os passos de Jesus, é fazer o que Ele fez, é andar a segunda milha (Mt 5:41), dar a outra face (Mt 5:39), é mortificar aquilo que ainda fica de mim mesmo é, após negar meu “eu”, crucificá-lo, para que eu esteja totalmente rendido a Cristo.
3.      Perder a vida – bom, se eu nego a mim mesmo e tomo a cruz, perder a vida estará junto. A cruz é um instrumento de morte, e quem diz que a toma, mas ainda insiste em preservar a sua vida, nunca entendeu a regeneração. Se eu morri realmente, se fui regenerado, perdi a minha vida, e hoje Cristo vive em mim (Gl 2:20). Se alguém se diz cristão e se vê amarrado ao senso de autopreservação, precisa se arrepender.
4.      Renunciar a tudo – renúncia não deve ser confundida com cruz. São coisas diferentes, apesar de andarem juntas. Um exemplo é o texto de Mateus 5:39, onde Jesus nos ensina a dar a outra face. A renúncia precede o tomar a cruz. Eu renuncio quando abro mão do direito de revidar a agressão, e tomo a cruz quando dou a outra face. Em Mateus 5:41, eu renuncio quando abro mão do direito de não caminhar uma milha, e tomo a cruz, quando ando a segunda. Não haverá o “tomar a cruz”, se não houver a renúncia. Renunciar a tudo significa não me justificar, não tentar fazer valer o meu senso de justiça, mas crer que o Senhor que me escolheu, me salvou, me justificou, está me santificando e vai me glorificar.

Que estas verdades eternas sejam vida prática em mim, testemunhem minha fé a todos os que convivem comigo, e que eu persevere nelas, pela graça de Deus, e pelo Seu poder, que opera em mim o querer e o realizar (Fp 2:13), até que Ele venha.

E Ele vem, sem demora!

14 de novembro de 2012

Do arrependimento I


"Então, convocando a multidão e juntamente os seus discípulos disse-lhes: Se alguém que vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me. Quem quiser, pois, salvar a sua vida perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por causa de mim e do evangelho salvá-la-á. Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro e perder sua alma?”
Mc 8.34-36

            O arrependimento é uma das palavras mais mal compreendidas da Bíblia, e o seu correto entendimento é fundamental para a vida de todo cristão. Na verdade, sem o entendimento preciso sobre arrependimento, sequer se pode falar em conversão, em regeneração, em justificação, em fé.
            Arrependimento significa mudança de atitude, mudança de governo. E é um dom de Deus, assim como a fé.

“Porque a tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende; mas a tristeza do mundo opera a morte.” 2Co  7:10

“Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?”
Rm 2:4

“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus."
Ef 2:8

            Está claro, através da Palavra, que fé e arrependimento são essenciais para a conversão, e também está claro que, ambos são dons de Deus, que Ele concede conforme o Seu propósito, a Sua graça, o Seu beneplácito, com vistas a manifestar a Sua glória.
            Uma coisa essencial que precisamos compreender é que não há em homem nenhum o desejo de se arrepender. A carne gosta do pecado, gosta de ser independente, gosta de se governar. O homem natural precisa, antes mesmo de se converter, de uma operação sobrenatural do Senhor, através do Espírito Santo, para levá-lo a estar convencido do seu pecado, da justiça de Deus (que requis o sacrifício de Jesus Cristo), e do Seu juízo, conforme as palavras do próprio Cristo:

“E, quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, e da justiça e do juízo.”
Jo 16:8

            Jesus também deixa explícito o coração do homem natural, quando explana para um grupo de fariseus:

“Examinais as Escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim testificam; E não quereis vir a mim para terdes vida.”
Jo 5:39-40

            O coração, o caráter, de qualquer homem, sem o Senhor, não é nem um milímetro melhor do que o do pior dos fariseus. E se eles não queriam ir a Cristo, eu, sem o Espírito Santo me convencer e trabalhar em mim, também não vou querer nunca. Enquanto for pregado e crido, no mundo e no meio das congregações, que o arrependimento cabe ao homem, o entendimento e o desfrutar dos seus efeitos será nulo. Deus leva, conforme a Sua vontade soberana, o homem ao arrependimento, Deus opera no homem a tristeza que produz este arrependimento, Deus convence o homem do pecado, e o homem que é tocado desta forma por Deus, inevitavelmente vai até Ele, arrependido, contrito, humilhado, rendido. Como Jesus mesmo diz, o homem que Deus tocou não pode resistir ao Seu toque:

“Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora.” 
Jo 6:37

            O entendimento pleno da operação sobrenatural que produz a Metanóia, a mudança de governo, de mente, de atitude interior, que é o arrependimento, a clareza de que é algo que o Senhor faz, e não o homem, traz para aquele que foi realmente regenerado um sentimento, também sobrenatural, de repúdio ao pecado que antes lhe agradava, um desejo de andar segundo aquEle que o chamou, uma necessidade de proclamar as Suas virtudes, um sentimento de que é forasteiro neste mundo, que antes o abrigava confortavelmente. O homem espiritual, revestido por Cristo, vive o arrependimento constante, sabedor de que a sua carne nunca se converte, mas sim, se rende ao poder do Espírito Santo que nele habita, e sabe também que a santificação é uma promessa de Deus, e que a luta contra a carne é diária. Ela vai durar até que Cristo retorne, e nos ache combatendo este combate, para o qual Ele nos forja a cada dia, através da Sua Palavra, do Seu poder que opera em nós, do nosso relacionamento com Ele, onde oramos, jejuamos, louvamos e clamamos por Sua graça.
            E viveremos assim, em guerra, mas Nele, até que Ele venha!

            E Ele vem, sem demora!!!!